Arquitetura de turismo e a relação com a paisagem: entrevista com Site Specific Arquitectura

No País dos Arquitectos é um podcast criado por Sara Nunes, responsável também pela produtora de filmes de arquitetura Building Pictures, que tem como objetivo conhecer os profissionais, os projetos e as histórias por trás da arquitetura portuguesa contemporânea de referência. Com pouco mais de 10 milhões de habitantes, Portugal é um país muito instigante em relação a este campo profissional, e sua produção arquitetônica não faz jus à escala populacional ou territorial.

Neste episódio da sexta temporada, Sara conversa com os arquitetos Patrícia Marques e Paulo Casta, do escritório Site Specific Arquitectura, sobre o projeto Casa de São Lourenço – Burel Panorama Hotel. Ouça a conversa e leia parte da entrevista a seguir.

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Sara Nunes: Hoje vamos falar de um projecto que se situa na Serra da Estrela, o ponto mais alto de Portugal. Eu confesso que tinha muita pena quando era pequena porque a minha mãe é brasileira e não gostava muito do frio, então os meus pais nunca queriam fazer férias na Serra da Estrela. A única vez que me lembro de ir lá foi apenas numa tarde em que deslizei um pouco na neve e vim embora. Não sei se vocês têm também memórias deste lugar, de passar lá férias, fins-de-semana, com neve, sem neve. Qual era a vossa relação antes do projecto com este território?

Patrícia Marques: Eu acho que aquilo que nós percebemos é que depois deste projecto o território é muito mais interessante no Verão do que no Inverno.

SN: A sério?

PM: Sim. É óbvio que é o único sítio em Portugal onde há neve assim com alguma...

SN: Expressão.

PM: É. A relação que nós tínhamos antes do projecto era essa. Era de vez em quando ir lá ver a neve... Mas isso, quer dizer, não é nada comparado com o que é que é aquele território sem ser com a neve. Não é a neve que faz aquele território efectivamente. Eu acho. Pelo menos é essa a minha opinião.

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SN: O que é que nota de diferença? Se calhar vê outras cores, as árvores, que estão tapadas pela neve, não é? Será isso?

PM: Eu acho é que quando vamos só à procura de neve a tendência é ir ao sítio menos bonito da Serra da Estrela, que é a Torre. É uma experiência que se esgota na neve. Nessa experiência da neve não há mais nada para experienciar naquela viagem. E quando não há neve, a pessoa está disponível para ver outras coisas e para ir a outros sítios que são – quer dizer, isto é a minha opinião – muito mais bonitos e igualmente únicos no país. Aquilo não é a única coisa de especial que aquele território tem. É o único em Portugal, mas [a experiência] está longe de se esgotar na neve.

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Paulo Costa: Eu penso que o projecto nos permitiu um bocadinho conhecer a Serra da Estrela. A memória que temos da serra era dessas férias de fim-de-semana em que íamos lá a correr, fazer [alguma coisa] com os plásticos... ou com outra coisa qualquer na neve, não é? E, de repente, essa é a imagem que Portugal tem da Serra da Estrela, ou que tinha. Acho que agora já é injusto fazê-lo na realidade. E esse eixo entre a Covilhã e a Torre (e até mesmo depois Seia) não é propriamente um espaço que tenha sido qualificado. O turismo que se tem feito é mais um turismo de massas e que não foi muito qualificado. De repente, o vale de Belmonte, o Vale de Manteigas... e o sítio onde estamos a fazer uma casa que é o Vale da Castanheira é um sítio... Nós nem deveríamos estar a dizer isto que é para não mostrarmos às pessoas os sítios que vamos conhecendo. (risos)

SN: Para ficar só para vocês. Isso não vale! O podcast é sobre partilha! (risos)

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PC: (risos) Não, mas é para não ser de massas na realidade. É que temos descoberto sítios tão incríveis e maravilhosos. A experiência, por exemplo, do [Burel Panorama] Hotel foi muito intensa a vários níveis, que nos fez, durante dois anos, ir lá à obra semanalmente e esse lado da natureza da Serra da Estrela – esse lado mais de Manteigas principalmente (o outro lado é mais escarpado) – é uma coisa que muda de semana para semana. É mágico. Na Primavera fica verde fluorescente, depois fica mais escuro, depois fica castanho, depois as plantas caem. Na Primavera há o amarelo, os roxos. É um sítio com uma riqueza extraordinária. E eu acho que, na altura, quando se começou a obra ainda não se conhecia muito. Agora nós vamos ouvindo mesmo colegas nossos, que às vezes vão lá ver o Hotel, [dizer] que, de repente, descobrem a Serra da Estrela daquela maneira. A Serra da Estrela deixou de ser a Torre e a Torre merecia muito mais também como noutras zonas. Aquilo que [este projecto] nos permitiu descobrir foi uma outra serra (aos lisboetas, pelo menos) que não nos era dada. Não era a serra que nós conhecíamos.

SN: E como é que nasceu este convite para este projecto que vos permitiu depois descobrir este lugar?

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PC: A história deste convite tem uma certa graça porque é um conjunto de encontros e de desencontros. O nosso cliente é a Burel Factory. No princípio do nosso atelier, fizemos um projecto com os paulistas (fizemos a biblioteca e depois fizemos a capela) e nós os dois, em particular, já estávamos muito interessados neste Burel porque a Burel tinha aberto uma loja que nós gostávamos imenso na Baixa [de Lisboa]. Já estávamos muito despertos para aquele material. Na Capela Jesus Mestre, o confessionário, por uma questão acústica, era aberto. Lá nós optámos por trabalhar com o burel e contactámos a Isabel Costa (da Burel) para nos fazer aquele trabalho. Foi uma experiência interessantíssima e gostámos imenso. A Isabel também, na altura, começou a trabalhar esse lado da arquitectura. [Isso ocorreu] no momento em que depois da [criação da] Casa das Penhas Douradas, o Grupo Pestana vendeu aquele edifício – que era a antiga Pousada de São Lourenço – à Burel, à Isabel Costa e ao João Tomás. A Isabel foi ter com o Nuno Gusmão da P-06... Este projecto é feito a quatro mãos com a P-06, com quem nós temos muitos trabalhos.

SN: Muitos projectos, não é?

PC: Muitos projectos. Como temos uma boa relação pessoal e não é só profissional, fazemos questão de que o trabalho aconteça desde o princípio. Mesmo quando estamos ainda na arquitectura, a P06 e o Nuno já estão presentes.

SN: Já agora, para esclarecer, a P06 é de design não é?

PC: É de design exactamente. Nessa altura, era ainda bastante mais de design gráfico e depois começou a expandir-se para os espaços. Hoje trabalha os ambientes. Esse trabalho foi um bocadinho acompanhado. Eles vinham do lado do gráfico e nós vínhamos do lado da arquitectura e encontrávamo-nos ali a meio. E interiores foram, na realidade, feitos por todos, pelos quatro. Trabalhámos sempre nesse sentido também no Museu Nacional da Música, em Mafra. Está agora está a obra a iniciar-se. Trabalhamos isso sempre em conjunto. Fazemos uma equipa na realidade. E a Isabel foi ter com o Nuno por causa da questão do design. A Burel trabalha muito com designers. Desenvolveu os materiais da Burel com vários designers e foi ter com o Nuno e o Nuno olhou para o edifício e disse...

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SN: “Eu não sei fazer isto. Preciso de um arquitecto.”

PC: Eles precisavam de um arquitectos e propôs-nos a nós. Na realidade, fechou um bocado o ciclo. Já tínhamos tido essa relação com a Isabel na capela que tínhamos feito. Ficou a equipa. Acho que cumpríamos também os requisitos da parte da Isabel e do João Tomás que tinha a ver com ter arquitectos novos [no projecto], que se envolvessem de corpo e alma no projecto.

***

Ouça a entrevista completa aqui e reveja, também, a quinta temporada do podcast No País dos Arquitectos:

Nota do editor: A transcrição da entrevista foi disponibilizada por Sara Nunes e Melanie Alves e segue o antigo acordo ortográfico de Portugal.

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Sobre este autor
Cita: Romullo Baratto. "Arquitetura de turismo e a relação com a paisagem: entrevista com Site Specific Arquitectura" 02 Dez 2023. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/1010362/arquitetura-de-turismo-e-a-relacao-com-a-paisagem-entrevista-com-site-specific-arquitectura> ISSN 0719-8906

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